19 junho 2011

eBird

É quase inevitável em cada saída de campo - tomar notas do que vemos, gráficas ou escritas. Geralmente apenas do que de menos usual observamos nos locais visitados - a primeira observação de uma determinada espécie, números invulgares de uma outra ou uma observação precoce de um migrador. Outras vezes anotamos tudo - onde fomos, qual a área percorrida e todas as aves que detetámos. E terminada a saída, as notas geralmente ficam guardadas - e por vezes esquecidas. O que é pena, pois têm potencial para mais./It is almost unavoidable in every field outing--to take notes of what we see, either drawn or written. Often we only take notes of what is more unusual, such as the first observation of a certain species, unusual numbers of another, or the early record of a migrating species. Sometimes we take more substantial notes--where we were, what was the area covered and all the birds we detected. And once the fieldtrip has ended, these notes are kept, but often forgotten. Which is a shame, for they have potential to become more.

E se estas notas não ficassem apenas guardadas e fossem disponibilizadas à comunidade, para que estas possam ser utilizadas para fins conservacionistas, científicos e, porque não, lúdicos? Foi com base nesta ideia que surgiu o projeto eBird. A ideia é simples - criar uma enorme base de dados com as nossas observações ornitológicas. E ver como o nosso pequeno contributo se torna num gigantesco esforço coletivo para mapear espécies de aves geográfica e temporalmente. Quando surgem os primeiros Cucos-canoros? Quando partem os últimos Milhafres-negros? Onde no país encontramos Calhandras-reais? Com o contributo de todos, podemos responder a estas questões - e manter a informação dinâmica e atual./What if these notes were not just kept but were instead made available to the community so that they could be used for conservation and scientific ends and--why not? -- recreation. It was based on this idea that project eBird was created. The idea is simple: to create an enormous database with our bird observations, and see how our small contribution becomes a gigantic collective effort to map bird species in space and time. When do the first Common Cuckoos arrive? When do the last Black Kites leave? Where in Portugal can we find Calandra Larks? With everyone's contribution we can answer these questions, and keep information dynamic and updated.
Deste gesto voluntário de cidadania participativa surgem resultados espantosos. Com um número impressionante  de mais de dois milhões de listas por mês - sobretudo provenientes dos Estados Unidos da América e do Canadá - pode-se mapear não só a distribuição das aves nos seus territórios de nidificação e invernada, mas também as migrações por elas empreendidas. Através destes mapas é possível detetar diferentes estratégias migradoras - como no caso de duas espécies de Carricinha norte-americanas, que até recentemente pertenciam à mesma espécie que ocorre em Portugal (note-se como a espécie do oeste Estado-unidense é essencialmente sedentária, ao passo que a espécie da costa leste migra para norte para nidificar). Ou refinar os mapas de distribuição das espécies de modo a que estes descriminem o terreno em causa - como neste caso do Tordo-dos-bosques, em que se nota por exemplo, como a espécie evita as altitudes elevadas da cordilheira montanhosa dos Apalaches. Ou ainda, como em casos tão dramáticos como o derrame de petróleo no Golfo do México, como esta ferramenta foi utilizada para mapear os efeitos deste desastre mapeando as aves petroleadas./From this voluntary act of civic participation, amazing results are produced. With an incredible number of over two million checklists per month (mostly from the United States and Canada), not only the distribution of birds in their breeding and wintering ranges can be mapped, but also their migration routes. Through these maps, different migration strategies of birds become clear . Take, for example, the case of two species of Wrens, that until recently belonged to the same species as the Eurasian Wren we find in Portugal. (Note how the data shows that the Western North-American species is essentially a resident species, as opposed to the Eastern species which migrates North to breed). Or how distribution maps can be fine-scaled to reflect the terrain--in this case, the Wood Thrush's distribution map, in which it becomes evident how this species avoids the higher altitudes of the Appalachian mountain range. This tool was also used in the dramatic Gulf Spill to map out the effects of this environmental disaster by keeping track of oiled birds.

Não se pense que só de observações em ambientes naturais vive o eBird. A uma escala mais modesta, é certo, o ambiente urbano surge também como uma peça deste puzzle. Quando surgem os Andorinhões-pálidos na Baixa Pombalina? E os Gorazes que pescam no rio Nabão em Tomar, quando deixam o país para rumar a África? Todas as observações contam - e com elas se tece esta enorme teia de informação que é o eBird./But eBird does not live by reports of natural environments alone. On a more modest scale, the urban environment is also a piece of this puzzle. When do the first Pallid Swifts reach Lisbon's Pombaline city centre? And when do the Black-crowned Night Herons that fish on the banks of the Nabão river in Tomar leave the country to Africa? All observations count--and with them is weaved the huge web of information that is eBird.
Mas para que tudo isto seja possível, é necessário o contributo de todos quantos gostam de observar aves. Se costuma tirar notas de campo sobre o que observou, porque não dar-lhes uma segunda vida e ajudar a mapear e quantificar as populações de aves? Se nunca tirou notas, experimente. Numa lezíria, ou sentado no seu jardim favorito, tome nota do que vê - quantas espécies diferentes deteta, e quantas aves de cada espécie. As notas podem ser tão simples como assinalar a presença de um Melro num jardim com um X, ou discriminar os todos os onze Melros que viu durante um passeio de meia hora nos jardins da Fundação Calouste Gulbenkian - desses quatro eram machos adultos, três eram fêmeas, dois eram juvenis e os restantes dois não conseguiu determinar porque apenas lhes ouviu os chamamentos de contato - assim como as restantes espécies que detetou. E deste simples exercício de observação verá como começa a reparar em coisas que até então lhe tinham passado despercebidas./But for all of this to be possible, we need the help of all who like to watch birds. If you usually take field notes about what you have watched, why not give those notes a second life and help to map and quantify the bird populations? If you have never written down any notes, why not try it out? At a grassland, or seated at your favourite public garden, take notes of what you see: how many species you can detect, and how many of each species can you count. Those notes can be as simple as marking the presence of an Eurasian Blackbird at a garden (tick!) or as descriptive as reporting all eleven Eurasian Blackbirds that you have seen during an thirty-minute walk at the Calouste Gulbenkian Foundation gardens--four adult males, three females, two juvenile birds, and for the remaining two you were not quite sure as you only heard their contact calls--as well as the other bird species. And from this simple observation exercise you will see how you will start noticing things that had been unnoticed before.

O projeto eBird está a dar os seus primeiros passos a nível mundial, disbonibilizando bases de dados para todos os países. Portugal arranca agora - e precisa de dados. Colabore e ajude a conhecer melhor a avifauna nacional, e a juntar mais uma peça ao mosaico mundial. Os dados recolhidos estarão disponíveis à comunidade científica e não só através do Avian Knowledge Network./The eBird project is taking its first steps at a global level, providing databases for every country in the world. Portugal starts now--and needs data. Contribute with your observations and help to promote a better knowledge of the Portuguese avifauna, and add up another piece to the world mosaic. The gathered data will be available to the community through Avian Knowledge Network.
Experimente. Aqui, em Brasília, em Dili ou em qualquer local do mundo, contribua com as suas observações para um melhor conhecimento das aves./Give it a go. In Lisbon, Brasilia, Dili or any other part of the world, contribute with your observations for a better knowledge of the birds.

Esboços de um bando de 175 Colhereiros - observação inserida no eBird
Sketches of a flock of 175 Eurasian Spoonbills -- reported on eBird


6 comentários:

  1. Parabéns Pef.
    É uma iniciativa muito interessante, mas à medida que fui lendo fui-me dando conta das enormes limitações que tenho no que à observação de aves diz respeito; Não queres organizar uma espécie de formação para iniciação à observação de aves?
    Obrigado, Abraço

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  2. Olá Filipe, podemos certamente agendar uma saída para isso, tenho todo o gosto.

    Saliento apenas que o eBird faz-se de todas as contribuições, de gente experiente e inexperiente. Há espécies que todos sabemos identificar - melros, pombos, cegonhas-brancas, perdizes-vermelhas - e essas podem ser reportadas sem grandes dúvidas. As outras, se não se souber, podemos ao inserir os dados escolher a opção 'não estou a reportar todas as aves que detetei'. Idealmente, a pouco e pouco vamos ganhando um melhor conhecimento das aves e serão cada vez menos frequentes as aves por identificar.
    Um abraço,
    PeF

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  3. Faço minhas as palavras do Filipe. Até que na Quinta das Conchas vejo todos os dias muitos pássaros mas são isso - pássaros. Toda a informação sobre eles seria preciosa pois o projecto parece me de grande valor.

    Força!

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  4. A Quinta das Conchas é um bom local para ver a grande maioria das aves urbanas de Lisboa. Podemos um dia destes combinar por lá.

    Há dois elementos que são imprescindíveis para a observação de aves - um bom guia de campo e binóculos. A Assírio & ALvim tinha a tradução do excelente COLLINS BIRD GUIDE, mas encontra-se esgotado. Sobre este guia muito haveria por dizer pois é uma pequena maravilha - o melhor guia de aves que conheço. Há um guia da LYNX que sairá em breve AVES DE PORTUGAL que poderá ser uma boa opção - ainda não o vi, mas a equipa de autores tem créditos firmados.

    Deixo aqui links para estas duas obras:

    http://www.harpercollins.co.uk/Our_Titles/Pages/Home.aspx?objID=36363

    http://www.lynxeds.com/product/aves-portugal

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  5. Obrigada. Vou ver os links e vou procurar. Ainda outro dia fiquei deliciada com um pássaro pequenino de bico amarelo e com uma estranha coloração, o que seria? Sou demasiado urbana e tenho pena. Um abraço.

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  6. Escapou-me que existia uma questão por responder aqui. De que cor era a ave? E era pequena - do tamanho de um Pardal? Ou mais pequeno ainda? E onde estava - no chão, numa sebe..?

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